SEJA BEM VINDO

Neste Blog você encontrará algumas matérias e estudos Bíblicos e também alguns estudos com conteúdos políticos e de interesse geral.
A intenção, mesmo que aos poucos, melhorarmos nossas visões limitadas do que é o cristianismo e partirmos em direção à santificação, à necessidade de meditação e estudo da
SANTA PALAVRA e também para que juntos com CRISTO
- possamos crescer de forma salutar e racional, ajudando uns aos outros. Espero que todos nós possamos ganhar com este Blog e seu conteúdo... Seja bem vindo e tire bom proveito!!!

quinta-feira, março 27, 2008

O triunfalismo

Escrito por pentecostalismo em fevereiro 19, 2008


O triunfalismo é um dos principais ensinos da teologia da prosperidade que se aproveita do materialismo dominante dos nossos dias.

INTRODUÇÃO

- Na lição anterior, vimos as bases da chamada “teologia da prosperidade” e sua total discordância com a Bíblia Sagrada. Nesta lição, prosseguiremos o seu estudo, desta feita, avaliando um dos seus mais funestos efeitos e a sua forma de execução, a saber, o “triunfalismo”.

- O “triunfalismo” é um comportamento de sutileza típica: aproveitando-se das circunstâncias que estão ao redor do crente, o adversário levanta homens e mulheres que geram expectativas de um “paraíso na terra”, desviando os olhares do povo daquilo que é relevante e permanente: a vida eterna.

I – O FALSO PRESSUPOSTO DO TRIUNFALISMO

- Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra “triunfalismo” surgiu em nosso idioma em 1965, com o significado de “atitude, crença ou doutrina de que determinado credo religioso é superior a todos os outros”. Mas, em 1980, adquiriu novo significado, a saber, “atitude excessivamente triunfante; sentimento exagerado de triunfo”. Já na própria história da palavra, vemos como é recente a sua infiltração no meio do povo de Deus e como se teve uma distorção dos corretos ensinos provenientes das Escrituras Sagradas.

- A palavra “triunfalismo” advém de “triunfo”, palavra de origem latina, “triumphus”, que era o nome que recebia “a entrada solene em Roma de um general vitorioso”, e que, por extensão, passou a significar “vitória”. Em Roma, além da entrada solene em Roma, era costumeiro construir “arcos do triunfo”, ou seja, “…um tipo de monumento introduzido pela arquitetura romana originalmente utilizado como um símbolo da vitória em uma determinada batalha. Cada arco do triunfo romano, portanto, remete-se a uma batalha e a um imperador específicos na história romana e sua memória era celebrada através desta construção.…” (WIKIPEDIA. Arco do triunfo. http://72.14.203.104/search?q=cache:qJ8-DhbWAdgJ:pt.wikipedia.org/wiki/Arco_do_Triunfo+%22arco+do+triunfo%22&hl=pt-BR&gl=br&ct=clnk&cd=1 Acesso em 26 abr. 2006).

- Ao falarmos em “triunfalismo”, portanto, estamos nos referindo a “uma atitude excessivamente triunfante”, a um “sentimento exagerado de triunfo” que tem tomado conta da vida de muitos crentes, que, insuflados por pregadores de um falso evangelho, evangelho este baseado na “teologia da prosperidade”, passam a se considerar “super-crentes”, pessoas que se encontram acima das dificuldades e das adversidades da vida e que, portanto, confundem vida espiritual com prosperidade material e imunidade aos males desta vida.

- O “triunfalismo”, como vimos na lição anterior, é uma atitude típica dos chamados “movimentos da fé” ou “teologia da prosperidade”. Como tivemos ocasião de observar, esta falsa doutrina parte da noção de que, na criação do homem, Deus entregou ao homem o domínio sobre a criação terrena, dando-lhe, pois, “direitos” que ele pode reivindicar diante da Divindade. Tanto assim é que, quando do episódio da queda, o que teria havido seria um “legítimo direito” do homem em transferir a Satanás o domínio desta mesma terra. Evidentemente que Deus não iria permitir isto e, por isso, teria elaborado o plano da salvação do homem, a fim de que o homem pudesse, legalmente, reaver o que havia transferido ao diabo.

- Como Jesus veio ao mundo e cumpriu este desejo do Senhor, o homem que aceita a salvação teria retornado a esta qualidade de “detentor de direitos” diante de Deus e, por isso, não há que se falar em adversidades, dificuldades ou quaisquer outros problemas para o salvo, uma vez que ele tornou a ter os “direitos” que lhe advieram pela “nova criação”. É a partir deste conceito, pois, que surge, no bojo da “teologia da prosperidade”, um triunfalismo, vez que o salvo se sente um “mais do que vencedor”, alguém que “triunfou sobre o diabo” e que, por isso, não tem mais que “pagar coisa alguma ao diabo”, que tem, simplesmente, de “fazer o diabo desaparecer da sua vida, dos seus bens, da sua família e da sua saúde”.

- Não obstante, não é isso que dizem as Escrituras Sagradas. Relembrando o que já estudamos na lição anterior, vemos que, em primeiro lugar, o homem não é portador de qualquer “direito” diante de Deus. Quando da criação, Deus fez o homem um simples “mordomo”: o domínio sobre a criação terrena não significa, em absoluto, propriedade, mas, sim, poder de administração. Tanto assim é que o homem foi feito “imagem e semelhança de Deus”, ou seja, embora tivesse pontos de contacto com o Senhor, não fora equiparado a Ele, o que, a propósito, é reconhecido pelo próprio Satanás que, valendo-se desta diferença entre Deus e os homens, levou o primeiro casal a desejar ser igual a Deus (cf. Gn.3:5).

- Ao se verificar o texto de Gn.1:26, vemos que, no hebraico, o verbo utilizado para designar o “domínio” do homem é “radah”, ou seja, “governar”, “dar regras”, que, na versão grega da Septuaginta é “archétosan” (αρχέτωσαν), que também significa “governar”, “administrar”. Não bastasse este significado, o texto bíblico mostra claramente que Deus mantém o controle de toda a situação, seja porque, encontramos Deus ordenando ao homem (Gn.2:15-17), seja porque a narrativa bíblica demonstra que o homem só exerce suas faculdades mais excelentes, entre as quais, a de dar nome aos demais seres (que é o símbolo de sua superioridade), sob os auspícios e a devida supervisão do Senhor (cf. Gn.2:19-23).

- Como se ainda isto não fosse suficiente, as Escrituras são claras ao afirmar que, enquanto o homem tem o governo sobre a criação terrena, o reino, a soberania permanece sendo de Deus, o “dono”, o “proprietário”, ou seja, aquele que tem “poder absoluto sobre a coisa”, pois esta é a noção de propriedade. É o que se verifica no Sl.24:1; 47:8; 59:13; 93:1; 96:10; 97:1; 99:1; Is.52:7 e Ap.19:6, entre outras referências. Nestes trechos, aliás, os verbos são diversos, pois dão a idéia do domínio absoluto. É o verbo “reinar” que está em foco, que, em hebraico é “malak” e, em grego, “ebasileuein” (εβασιλευειν).

- O “triunfalismo”, portanto, perde já na sua base, pois todo o edifício que dá ao homem uma qualidade de “super-crente” parte do pressuposto de que ele é “detentor de direitos” diante de Deus e que, por isso, Deus é “obrigado” a praticar determinadas ações em favor dos “salvos”, por força dos “direitos” existentes no relacionamento entre Deus e a humanidade. Nada mais falso. Se é verdade que Deus nos resgatou do pecado e da perdição eterna, fê-lo porque é amoroso e tudo nos concede por “graça”, ou seja, “favor não merecido”, conceito bem diverso do de “direito”. Para nos utilizarmos da linguagem jurídica, tão ao gosto dos “triunfalistas”, a salvação do homem e as bênçãos decorrentes dela são fruto de uma “liberalidade” divina, não de uma “obrigação”.

OBS: “Liberalidade”, como nos diz o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa é ” disposição daquele que, em seus atos ou em suas intenções, dá o que não tem obrigação de dar e sem esperanças de receber nada em troca”. (grifo nosso)

- A idéia de “triunfo” por parte do ser humano é alheia ao texto bíblico. Na Versão Almeida Revista e Corrigida, a única vez em que aparece a palavra “triunfo” é no Sl.47:1, tradução esta, entretanto, que não é a melhor, vez que a palavra hebraica “rinnah” significa “voz alta”, “clamor”, “alegria”, “júbilo”, sendo estas as palavras utilizadas pelas demais versões, a começar da Almeida Revista e Atualizada.

- O verbo “triunfar” aparece em dois versículos da Versão Almeida Revista e Corrigida. A primeira vez, em Mt.12:20, quando o evangelista faz referência a uma profecia de Isaías, dizendo que o “servo do Senhor” (ou seja, o Messias) iria “triunfar em juízo”, palavra repetida pela Tradução Brasileira, mas que é tradução de “nikos” (νικος), que significa “vitória”, tanto que a Versão Almeida Revista e Atualizada prefere utilizar a palavra “vencedor”. De qualquer maneira, quando se fala em “triunfo”, está-se referindo a Jesus, Ele, sim, o triunfante contra o mal e o pecado.

- A segunda vez que se fala em “triunfar” na Versão Almeida Revista e Corrigida é no texto de II Co.2:14, um dos textos mais caros aos “triunfalistas”, onde temos o verbo grego “thriambeuonti” (θριαμβεύοντι), cujo significado é, efetivamente, “triunfar”. Para que verifiquemos se, neste texto, encontramos base para o pensamento triunfalista, nada melhor que transcrevê-lo para uma devida análise de sua literalidade:

E graças a Deus, que sempre nos faz triunfar em Cristo e, por meio de nós, manifesta em todo lugar o cheiro do seu conhecimento.

- Neste texto, é inegável que a idéia do triunfo está associada à imagem da entrada do general vitorioso em Roma. Temos, assim, a verdadeira reprodução, na Bíblia Sagrada, da cena que dá origem ao “triunfo”. Mas, então o crente pode se comportar como um verdadeiro “general vitorioso”, que entra na sua cidade orgulhoso de sua condição de vitória, pronto a desfrutar das benesses dela decorrentes, ou seja, dos “direitos” resultantes da sua vitória militar, o que, em Roma, quase sempre, significa concessão de poder e de autoridade?

- A despeito de ter sido esta a interpretação dada pelos “triunfalistas”, o texto não nos autoriza a pensar desta maneira. O apóstolo Paulo, ao nos trazer a imagem do triunfo, está, sim, pondo o crente não na posição do general vitorioso, mas, ao contrário, o crente, diz Paulo, faz parte do “despojo” do vitorioso. Com efeito, quando o general ingressava em Roma, no seu “triunfo”, era seguido pelos bens e prisioneiros que eram capturados durante a guerra.

OBS: Flávio Josefo dá-nos uma idéia de como isto se dava, quando descreveu o “triunfo” de Tito, o general que destruiu Jerusalém e o templo no ano 70. Diz o historiador judeu: “…O dia de pompa tão soberba chegou e não houve uma só pessoa naquela infinita multidão de povo, que enchia toda Roma, que não quisesse presenciá-la.(…). É impossível descrever a magnificência desse festejo triunfal.(…). Viam-se todas as espécies de vestuários de púrpura (…). Havia estátuas de deuses, das diversas nações, de tamanho surpreendente.(…). Havia ainda várias espécies de animais raros e estimados, pela sua qualidade(…). Nada, porém, causava tanta admiração aos espectadores do que as diversas representações, como grandes armações de três ou quatro andares.(…). Eram imagens de cenas da guerra, as mais notáveis representadas ao natural.(…). Sobre cada uma dessas cidades, estava representado aquele que as havia defendido e de que maneira havia sido aprisionado. Vinham em seguida vários navios; entre a grande quantidade de despojos, os mais notáveis, eram os que tinham sido feitos no templo de Jerusalém; a mesa de ouro, que pesava vários talentos, o candelabro de ouro, feito com tanta arte(…). Simão, filho de Gioras, que depois de ter tomado parte no desfile triunfal, entre os outros escravos,…” (JOSEFO, Flávio. Tradução de Vicente Pedroso. Guerra dos judeus contra os romanos VII, 16,17. In: História dos hebreus, v.3, p.197-8).

- Ao dizer que Deus nos faz “triunfar em Cristo”, o apóstolo está nos dizendo que fazemos parte do “despojo” de Cristo, ou seja, somos o resultado da Sua vitória sobre o mal e o pecado, da Sua vitória sobre o adversário das nossas almas. O crente é um troféu que Cristo apresenta a Deus como prova da Sua vitória sobre o adversário das nossas almas. Daí porque a expressão da Versão Almeida Revista e Atualizada, qual seja, “nos conduz em triunfo” ou, na Nova Versão Internacional, “nos conduz vitoriosamente em Cristo”, ou seja, somos parte do espetáculo que Deus mostra a todo o universo para celebrar a vitória de Cristo sobre a morte e o inferno.

- Destarte, também este texto, em absoluto, põe o salvo no lugar do “general vitorioso”, nem estabelece qualquer base para que “esmaguemos a cabeça da serpente”, “amarremos o diabo”, ou, muito menos, “exijamos os nossos direitos” diante de Deus, mas, tão somente serve para nos mostrar que o vitorioso é Cristo e que, graças à Sua vitória, fomos por Ele conquistados para desfrutar, na Sua companhia, da vida eterna na cidade celestial.

II – A VIDA DE COMUNHÃO COM DEUS NÃO NOS IMPEDE DE TERMOS ADVERSIDADES NESTA VIDA

- A base do “triunfalismo” é dizer que, a partir do momento em que o homem aceita a Jesus como seu único e suficiente Senhor e Salvador, não é mais possível que o homem passe a ter problemas na vida sobre a face da Terra, pois a sua comunhão com Deus, a sua salvação lhe traz uma posição de “triunfo”, de vitória sobre o diabo. Portanto, é impossível que o salvo venha a sofrer enfermidades ou quaisquer outras necessidades, em especial, as relativas à vida econômico-financeira.

- Este raciocínio, como vimos na lição anterior, é antiqüíssimo, já se encontrava na teologia distorcida dos “amigos de Jó” e, conforme também visto, não representa um pensamento correto a respeito de Deus, como o denunciou o próprio Senhor em Sua conversa com Elifaz (Jó 42:7).

- A salvação é a maior bênção que um mortal poderia receber. Ela é a solução para o problema insolúvel do homem, qual seja, a sua separação de seu Criador por causa do pecado. Sem condições de resolver esta questão, o homem estava irremediavelmente perdido, mas Deus, desde o instante em que sentenciou o homem pelo seu pecado, prometeu reverter o quadro, o que se deu na pessoa de Cristo Jesus.

- Assim, a salvação é, sobretudo, uma bênção espiritual, tem a ver com o reatamento do relacionamento entre Deus e o homem e isto é o mais importante, pois a questão da eternidade é fundamental para o ser humano, que não foi criado para deixar de existir, mas cuja existência perdurará para sempre, na companhia de Deus, ou não.

- Não é por outro motivo que a questão relativa à vida eterna tem de ser tratada prioritariamente pelo ser humano. As Escrituras não cessam de mostrá-lo ao longo de suas páginas. Desde Abel, a Bíblia não nos cansa de mostrar que o segredo da vitória do homem está em buscar, em primeiro lugar, o reino de Deus e a sua justiça (Mt.6:33). Segundo Jesus nos mostrou no sermão do monte, é este o fator distintivo entre os “gentios”, entendidos estes como os que não têm compromisso com Deus e os verdadeiros adoradores do Senhor.

- Aceitando a Cristo como único e suficiente Senhor e Salvador, ocorre o maior milagre que poderia acontecer, qual seja, o de passarmos da morte para a vida (Jo.5:24), de sair das trevas e ir para a luz (Jo.3:20,21), tornando-se novas criaturas (II Co.5:17; Gl.6:5), cuja posição, agora, é a de estar nos lugares celestiais em Cristo, onde é abençoado com toda a sorte de bênçãos espirituais(Ef.1:3).

- Notamos, portanto, que, de pronto, a promessa de Deus que advém da salvação é a do desfrute de todas as bênçãos espirituais. Não há qualquer registro nas Escrituras de promessa de “todas as bênçãos materiais”, mas, sim, de “todas as bênçãos espirituais”. É esta a promessa dada por Deus e Ele vela pela Sua Palavra para a cumprir (Jr.1:12). As Escrituras, coerentemente, dão a devida importância e relevância para o aspecto espiritual, pois é isto que temos de buscar em primeiro lugar, isto é o que importa. Aliás, foi esta a ordem de Cristo: “Trabalhai não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do Homem vos dará, porque a este o Pai, Deus, o selou” (Jo.6:27).

- Não só o crente deveria se preocupar em ter uma vida espiritual abundante, cada vez mais crescente, como também deveria, em sua vigilância contínua, zelar, prioritariamente, também pelo seu bem-estar espiritual. É, também, orientação do Senhor: “E não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei, antes, aquele que pode fazer perecer, no inferno, a alma e o corpo” (Mt.10:28). Como podemos verificar, a preocupação do cristão deve ser com a sua vida eterna, com o seu relacionamento com Deus, deixando todas as demais coisas, conquanto necessárias, num segundo plano.

- Esta é a mesma conclusão que tiramos da vida do mais sábio homem que houve sobre a Terra, depois de Jesus. Salomão, no seu livro da velhice, o livro de Eclesiastes, com a autoridade que tem alguém que recebeu de Deus todas as bênçãos materiais possíveis, diz, ao término de sua pregação, que, diante de todas as bênçãos materiais recebidas, de tudo o que granjeou e desfrutou, chegava à conclusão seguinte: “De tudo o que se tem ouvido, o fim é: Teme a Deus, e guarda os Seus mandamentos, porque este é o dever de todo o homem. Porque Deus há de trazer a juízo toda a obra, e até tudo o que está encoberto, quer seja bom, quer seja mau” (Ec.12:13,14). Ao verificar toda “a vida debaixo do sol”, que é o tema do livro de Eclesiastes, Salomão concluiu que tudo o que importa é o nosso relacionamento com Deus, o dever de todo o homem de obedecer-Lhe, pois é diante do Senhor que nos apresentaremos para prestar contas daquilo que fizemos nesta vida

- Dentro desta perspectiva é que devemos entender que, sobre a face da Terra, a vida nos reserva tanto alegrias quanto tristezas, tanto dias bons quanto dias maus. Quando vemos o que a Bíblia diz a respeito disto, constatamos, para desmentido dos triunfalistas, que o justo não está livre de sofrer contratempos na vida, de ter problemas e dificuldades. As Escrituras, quando falam da adversidade, nunca excluem o justo dele. Senão vejamos:

- No Sl.27:5, o salmista diz que, o dia da adversidade, será escondido no pavilhão de Deus, ou seja, além de o salmista admitir que sofrerá esta adversidade, ainda nos informa que esta adversidade tanto não é prova de que está sem Deus, que será o próprio Deus quem o acalantará durante este período difícil da sua vida. Nem se diga que se trata de um “derrotista”, de um “crente sem fé”, como costumam dizer os triunfalistas, pois quem escreveu este salmo foi Davi, um “homem segundo o coração de Deus”, um exemplo de guerreiro e de vencedor de batalhas e, como se isto não bastasse, num salmo em que se louva a falta de medo, em que se louva a coragem daquele que confia em Deus. Entretanto, a coragem, a fé em Deus não retiram o fato de que o justo passa, sim, por problemas e dificuldades e disto Davi dá testemunho na sua vida.

- No Sl.35:5, o salmista não só fala que o justo passa por adversidade, como ainda que, por causa da adversidade, os seus inimigos se vangloriavam e festejavam. O salmista, apesar desta situação aflitiva e de confiar que ela será revertida, não deixa de mostrar que se encontra em comunhão com o Senhor, que se humilha e jejua na presença de Deus, não tendo, pois, perdido a sua salvação. Isto, porém, não impediu que houvesse a adversidade.

- Em Ec.7:14, é dito que Deus fez tanto o dia da prosperidade, quanto o dia da adversidade e, com uma finalidade, a saber: “para que o homem nada ache que tenha de vir depois dele”. Assim, um dos motivos pelos quais Deus permite a todo ser humano passar por adversidades é para que entenda a efemeridade da existência sobre a Terra e o seu correto lugar na ordem do universo. O sábio, pois, faz questão de nos mostrar que esta sucessão de dias se dá a todo o ser humano, indistintamente, seja ele alguém que serve a Deus, seja ele alguém que não O serve.

- Mas, dirá alguém, que, quando se fala em adversidade, temos o Sl.10:6, onde é dito que “Não serei abalado, porque nunca me verei na adversidade”. Tal pensamento, bem apropriado para os “triunfalistas” que, como veremos, são mestres na arte de retirar textos fora do contexto nas Escrituras para alicerçar seus conceitos, não resiste a uma análise superficial. Quem diz que nunca estará em adversidade, à moda dos triunfalistas? São os ímpios, como vemos a partir do Sl.10:2, onde é dito que “os ímpios, na sua arrogância, perseguem furiosamente o pobre”; no Sl.10:3, diz-se que “o ímpio gloria-se do desejo da sua alma”; no Sl. 10:4, “por causa do seu orgulho, (…) não investiga,…”; no Sl. 10:5, “os seus caminhos são sempre atormentadores”, para então, no versículo 6, dizer que “não será abalada, nunca se verá na adversidade”. Temos, pois, que o texto, tão do gosto dos triunfalistas, mostra-nos, bem ao contrário do que eles desejam, que a idéia de que não se passará jamais por adversidade é uma idéia típica de quem não serve a Deus, é a idéia típica do arrogante, do auto-suficiente, daquele que “dispensa Deus” das suas vidas, do orgulhoso, do pecador.

OBS: A Nova Versão Internacional apresenta um texto que bem traduz as pregações dos triunfalistas dos nossos dias: “…’Nada me abalará! Desgraça alguma me atingirá, nem a mim nem aos meus descendentes’…” (Sl.10:6).

- O que verificamos, neste Salmo 10, é uma das muitas lições da Bíblia a respeito da evidência de que o justo, apesar de ser justo, nem por isso está livre de passar por adversidades. A “vida debaixo do sol” possui esta característica. Jesus disse aos discípulos que, no mundo, teriam aflições (Jo.16:33), ou seja, “thlipsis” (θλιπσις), cujo significado é “angústia”, “problema”, “tribulação”, “perseguição”, expressão que designava o ato de moer o grão para produção de farinha. Tal palavra foi dada aos discípulos, isto é, aos que serviam a Jesus. Esta foi a única garantia e certeza dada por Cristo aos Seus, sendo até uma das “bem-aventuranças” mencionadas no intróito do sermão do monte, qual seja, a dos injuriados e perseguidos por causa do nome de Jesus (Mt.5:11,12).

- Como, então, dizer que o crente, se em comunhão com Deus, jamais sofrerá dificuldades? Como afirmar, com base nas Escrituras, que a vida do salvo é imune a qualquer tipo de problema, seja ele enfermidade, conflito familiar, injustiça, carência econômico-financeira, carência afetiva ou outras coisas mais?

- No mesmo sermão do monte, Jesus fez questão de ensinar Seus discípulos de que as dificuldades ocorridas durante a “vida debaixo do sol” ou “vida debaixo do céu” (Ec.1:13) são de três origens, que tanto ocorrem para os sábios, que são os servos do Senhor, como para os insensatos, que são aqueles que não servem a Deus, a saber (Mt.7:25,27):

a) dificuldades surgidas por ação direta de Deus, as chamadas provações divinas, que foram representadas pelo Senhor pela chuva, que vem do céu.

b) dificuldades surgidas por ação direta das hostes espirituais da maldade, as chamadas tentações ou ações malignas, que foram representadas pelo Senhor pelos rios, que vêm de debaixo do solo, das regiões inferiores.

c) dificuldades surgidas da aplicação da “lei da ceifa” (Gl.6:7), ou seja, conseqüências das atitudes dos próprios homens na sua convivência com o semelhante, que foram representadas pelo Senhor pelos ventos, que vêm dos lados.

- Um dos graves erros dos “triunfalistas” está em repetir o gesto do ímpio do Salmo 10, que “não investiga”, ou seja, dentro da teoria “triunfalista”, todo e qualquer mal que sobrevém ao crente seria uma “obra de Satanás”, uma “obra demoníaca”, motivo por que se deve “determinar”, ou seja, como vimos na lição anterior, na definição dada por R.R. Soares, “… não é ordenar a Deus e sim ao diabo que tire de nós suas garras e desapareça de nossas vidas, de nosso dinheiro e de nossas famílias.” (Curso Fé. Aula 1. Determinação. http://www.ongrace.com/cursofe/licoes.php?id=1″>http://www.ongrace.com/cursofe/licoes.php?id=1 Acesso em 20 abr. 2006).

- Contudo, Jesus nos ensina que nem sempre uma adversidade é resultado da obra do inimigo. Muito pelo contrário, muitas vezes estamos a padecer por causa de atitudes que nós mesmos tomamos ao longo de nossas vidas, esquecendo-se de que o controle de todas as coisas está nas mãos do Senhor, que não Se deixa escarnecer e que faz valer a Sua soberania, inclusive para que haja o cumprimento da Sua Palavra. Em outras oportunidades, o que está acontecendo nada mais é que uma provação divina, uma permissão divina de sofrimento ao justo para que, por meio desta tribulação, este Seu servo adquira paciência, experiência e esperança, tudo tendo em vista o seu crescimento espiritual (Rm.5:3,4).

- Não podemos agir como os ímpios, mas, diante de uma dificuldade ou adversidade, proceder a uma investigação, a uma apuração dos fatos, como nos dá a entender o verbo hebraico “darash”. É preciso que, ante um problema, paremos e nos examinemos, verifiquemos qual é a causa, a razão de estarmos a passar por isso. Se não for encontrado um caminho mau em nós, após esta sondagem profunda, não só empreendida por nós, mas que encontre, também, a ajuda do Espírito de Deus (cf. Sl.139:23,24), então saberemos que se trata de uma prova divina e, como tal, devemos suportá-la, sabendo que tudo o que se passar será para o nosso bem (Rm.8:28).

- Os “triunfalistas”, porém, trazem um outro conselho, verdadeiro conselho de ímpio (Sl.1:1), que deve ser evitado, que é o de “determinar”, “recusar”, “não aceitar” a dificuldade. Para tanto, como entendem que tudo o que sobrevier ao crente salvo será obra maligna, exigem que expulsemos o adversário e, “usando da fé”, repudiemos o maligno, usando a “autoridade” que tem o verdadeiro e genuíno crente. Tal situação somente valerá para as hipóteses em que se estiver diante de uma tentação, de uma obra maligna, quando, então, no nosso auto-exame, recorrendo ao Senhor, teremos o livramento COMO e QUANDO o Senhor assim o desejar. Se, no entanto, tratar-se de aplicação da “lei da ceifa”, como podemos resistir ao Senhor e à soberania da Sua Palavra? (II Cr.20:6; At.11:17) De igual modo, como lutar contra a provação que nos é posta pelo próprio Deus?

- “Enfrentar Deus”, “pôr Deus contra a parede”, como defendem os triunfalistas é um comportamento reprovável e absurdo. É a conduta que os ímpios, como nos mostra o Salmo 10, tomam, já que, “em sua presunção, o ímpio não O busca; não há lugar para Deus em nenhum dos seus planos.” (Sl.10:4 NVI). No entanto, como Deus é prioridade em nossos corações, como é Ele a nossa própria razão de viver, jamais poderemos agir como se não O levássemos em consideração. Todavia, é assim que os triunfalistas nos mandam agir, o que, não é preciso sequer dizermos, será a causa de nossa ruína, pois um tal proceder é pura rebelião, e, como sabemos, “…a rebelião é como o pecado de feitiçaria, e o porfiar é como iniqüidade e idolatria…” (I Sm.15:23 “in medio”). Que Deus nos guarde, pois, porque, como sabemos, os feiticeiros e os idólatras ficarão do lado de fora da cidade santa (cf. Ap.21:8; 22:15).

- Não fossem já estes conceitos que extraímos da Palavra do Senhor suficientes para demonstrar que a vida espiritual não significa, em absoluto, imunidade a dificuldades e adversidades ao longo da vida, o fato é que a Bíblia, também, nos dá muitos exemplos de homens e mulheres de Deus que, apesar de sua vida de comunhão com o Senhor, sofreram terrivelmente e não foram poupados de adversidades e de problemas na sua “vida debaixo do sol”.

- É até interessante observar que, na galeria dos chamados “heróis da fé”, ou seja, o capítulo 11 da epístola aos Hebreus, que é como que um “desfile triunfal” dos servos de Deus, uma demonstração de que vale a pena ter fé em Deus, o escritor, a despeito de considerá-los homens e mulheres dignos de nota, verdadeiras testemunhas do Senhor que animam os crentes de todas as gerações a ter uma vida de comunhão com Deus (cf. Hb.12:1-3), não deixa de mostrar que este heroísmo, este triunfo não representou qualquer isenção, por parte de Deus, de dificuldades ou de tribulações, muitas das quais sem sequer a reversão do quadro desfavorável quando o servo do Senhor ainda em vida se encontrava.

- Assim, a começar por Abel (um dos quais o quadro desfavorável não foi revertido, vez que, pela sua justiça, foi morto sem que tivesse sequer chance de “triunfar”), o escritor fala-nos de diversas personagens, os quais, como aduz ao término da exposição, “…experimentaram escárnios e açoites, e até cadeias e prisões. Foram apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, e montes, e pelas covas e cavernas da terra. E todos estes, tendo tido testemunho pela fé, não alcançaram a promessa” (Hb.11:36b-39). Onde, pois, a imunidade diante da adversidade de quem serve a Deus? Não eram todos estes “heróis da fé”? Não são todos estes “testemunhas” que servem de estímulo para nós? Por que, então, não “determinaram” e evitaram o mal sobre suas vidas? Temos, assim, a prova cabal de que a vida de comunhão com Deus jamais significou a impossibilidade de sofrer adversidades e problemas e, por vezes, até mesmo a morte sem que tivesse havido a suplantação da situação adversa.

- Diante de tão explícito texto, não demoram os triunfalistas em alegar que o escritor aos hebreus está a narrar a situação “antes da morte de Cristo”, quando o “mundo ainda estava legalmente nas mãos de Satanás”. Nada mais falso. Estes homens e mulheres mencionados pelo escritor aos hebreus são os “heróis da fé”, ou seja, embora tenham vivido antes da realização da redenção pelo Senhor Jesus, nela creram e, por causa desta fé, são também santos e se encontram num estado de salvação igual ao nosso. Quem o diz é o próprio escritor, na continuação do texto do capítulo 11, “in verbis”: “Provendo Deus alguma coisa melhor a nosso respeito, para que eles sem nós não fossem aperfeiçoados”. Como se percebe, tanto estes “heróis” quanto nós devemos ser “aperfeiçoados”, ou seja, gozamos da mesma condição espiritual.

- Mas os triunfalistas prosseguem, dizendo que o texto nos fala de “alguma coisa melhor a nosso respeito” e esta “coisa melhor” seria a imunidade às “obras do mal”. Na nova aliança, dizem eles, não há que termos o mesmo sofrimento dos patriarcas e dos profetas, pois existe “alguma coisa melhor”. Não resta dúvida de que o escritor aos hebreus nos diz que existe “alguma coisa melhor”. Aliás, esta “alguma coisa melhor” é, precisamente, a mensagem de todo o livro, pois podemos resumir a mensagem crística de Hebreus nas palavras “Jesus é melhor”.

- Esta “alguma coisa melhor” não é, para tristeza dos triunfalistas, a imunidade a provações ou dificuldades, mas o próprio Jesus. Como, na continuação do texto, mostra-nos o escritor da carta, os crentes, ao contrário dos “heróis da fé”, têm, além do testemunho dos próprios heróis, o exemplo de Jesus(Hb.12:2,3), que foi revelado à Igreja e que ainda não havia sido plenamente revelado aos santos do Antigo Testamento. Esta “alguma coisa melhor” é a possibilidade que temos de olhar para Jesus, que a nós foi revelado, algo que foi muito desejado, mas não alcançado por aqueles justos (Mt.13:17; Lc.10:24) e, diante deste olhar, nos mantermos firmes, apesar de todas as provações e dificuldades que venhamos a enfrentar. Provações e dificuldades? Sim, pois, também para tristeza dos triunfalistas, o escritor aos hebreus, ao falar do exemplo de Cristo, anima os crentes hebreus a resistir na fé apesar de todas as adversidades (Hb.12:4).

- Por fim, para provarmos que as dificuldades e as adversidades não são coisas que caracterizaram o Antigo Testamento, como defendem os triunfalistas, basta mencionarmos as aflições e sofrimentos dos apóstolos e demais discípulos na igreja primitiva, como o martírio de Estêvão e de Tiago, sem falar nas diversas adversidades do ministério de Paulo (II Co.11:23-27). A conclusão só pode ser, pois, uma: a Bíblia nunca ensinou que o crente não sofre por ter fé em Deus.

III – PRÁTICAS TRIUNFALISTAS A SEREM EVITADAS

- Como dissemos desde a lição anterior, a teologia da prosperidade e seu principal subproduto, que é o triunfalismo, tem infestado como erva daninha as igrejas evangélicas nestes últimos dias desta dispensação, gerando erros doutrinários, quando não apostasia, na medida em que desvia a atenção dos servos do Senhor do que é prioritário e relevante.

- O triunfalismo tem se instalado na vida de muitas igrejas locais e de muitas pessoas em função de muitos fatores, mas, notadamente, porque encontra um ambiente sócio-econômico-ideológico-espiritual favorável para a sua disseminação.

- As sociedades têm se interligado como nunca, com o aumento da tecnologia e da ciência, fazendo com que seja cada vez mais realidade o que se denominou de “aldeia global”, ou seja, todos têm acesso a muitas informações, como se todos vivessem numa pequena aldeia, onde todos conhecem a todos. Entretanto, estas sociedades são relacionadas por intermédio dos meios de comunicação, pela mídia, que, como se verifica em todo o mundo, está nas mãos de poucas pessoas que, se dominadas pelo espírito do anticristo, como são em sua grande e esmagadora maioria, disseminam os valores mundanos, fazendo imperar tudo aquilo que desagrada a Deus. O resultado é que, a cada dia que passa, o pecado se multiplica e, com ele, todas as mazelas, que tornam o ambiente social cada vez mais aviltante ao ser humano, cada vez mais hostil. A dura e triste realidade é, então, ardilosamente escamoteada, estereotipada, ou seja, passa-se a difundir uma imagem irreal, ilusória da realidade, de que é prova, nos nossos dias, o crescimento da indústria do entretenimento e das iniciativas para que as pessoas vivam um “mundo virtual”. Esta “fantasia” que é vendida aos homens é também estendida à área espiritual, de maneira que as pessoas também passam a ser presas de “fantasias”, “mágicas” e “ilusões” que se apresentam travestidas de Bíblia Sagrada e de Palavra de Deus.

- Não é difícil entender, pois, porque uma das principais marcas do triunfalismo seja a promoção de “campanhas”, expressão, aliás, que vem diretamente do “marketing”, área do conhecimento humano que se desenvolveu grandemente no século XX e que é, precisamente, a utilização da técnica da “fantasia” e da “ilusão” para se obter resultados concretos na realidade da disputa selvagem pela preferência das pessoas, reduzidas hoje a simples consumidoras de produtos e serviços que lhes são oferecidos.

OBS: Campanha, em “marketing”, é o “conjunto de mensagens e ações comunicacionais (anúncios, promoções, eventos etc.) com o objetivo de exaltar as qualidades de determinado produto comercial, para torná-lo vendável, ou para tornar mais conhecido e aceito o nome de alguém, a marca de uma empresa, um serviço, uma idéia, uma causa etc.”

- Não vemos como possamos denominar de “campanhas” a adoração a Deus e o culto que Lhe é devido. Jesus mandou-nos anunciar o Evangelho (Mc.16:15), ou seja, dizer ao mundo que Ele salva, cura, batiza com o Espírito Santo e nos leva para o céu, esta mensagem simples mas eficiente que, há cem anos, tem promovido o maior e mais longo avivamento que a Igreja experimentou em toda a sua história, a verdadeira “chuva serôdia” que antecederá a colheita dos salvos desta Terra, o que se dará no dia do arrebatamento, que está tão próximo.

- O anúncio do Evangelho é, em primeiro lugar, a pregação da Palavra (Mc.16:20), como vemos na igreja primitiva, em especial no livro de Atos dos Apóstolos. Ao se pregar a Palavra, o Senhor coopera conosco e confirma esta mesma Palavra com os sinais que se seguem. Todavia, os triunfalistas fogem da Palavra, porque ela não os sustenta, e têm trocado a Palavra por “campanhas”, ou seja, por estratégias e técnicas de comunicação que buscam emocionar o povo, persuadi-los a adotar comportamentos quase sempre vinculados ao consumo de produtos e de serviços. Como bem afirmou o sociólogo da religião, Flávio Pierucci, “…as religiões mais bem-sucedidas são aquelas que (…) passaram a oferecer serviços lábeis [ i.e., instáveis, que passam rapidamente, observação nossa], que na linguagem das ciências sociais da religião desde os clássicos (…) são definidos como vias de salvação mágicas ou mágico-místicas. Caracteriza tais serviços o fato de serem tópicos[i.e., externos, superficiais), não permanentes e de consumo imediato, o mais das vezes oferecidos em troca de pagamento.…”(Religião. Folha de São Paulo, caderno Mais!, 31 dez. 2000, p.20-1)

- A prática da “campanha” é, portanto, uma clara demonstração do que é e o que representa o triunfalismo. Ao se adotar uma estratégia voltada para o consumo de bens e de produtos, o triunfalismo revela sua postura materialista, seu intento de se aproveitar das dificuldades sociais da atualidade para arrecadação de fundos e de dinheiro. Em nome de uma “fantasiosa” imunidade contra o mal, os triunfalistas mostram-se, na verdade, como escravos do dinheiro, como os falsos mestres dos últimos dias que fariam dos crentes negócio por causa de sua avareza (II Pe.2:3). São verdadeiros “mercenários da fé”, que concebem a fé como “algo”, a saber, como “fonte de enriquecimento material”.

- Não encontramos na Bíblia qualquer “campanha” que tenha sido feita por Cristo ou por Seus discípulos. Tal prática era completamente desconhecida da Igreja, não porque estivéssemos na Antigüidade, mas porque não se trata de um procedimento que tenha guarida nas Escrituras. A oração e a apresentação de pedidos ao Senhor deve ser uma constante na vida da Igreja (I Ts.5:17), sendo, também, biblicamente prevista a reunião da igreja para pedidos especiais (At.12:5), mas nada disto se confunde com as “campanhas” que se têm difundido e propagado, cujo único intuito é “pôr Deus contra a parede”, “amarrar o diabo”, criar um clima emocional e sem qualquer espiritualidade, cuja principal intenção nada mais é senão a arrecadação de fundos e de numerário para os cofres de algumas organizações religiosas.

- Encontramos, então, o outro aspecto explorado pelos triunfalistas nestes dias tão difíceis: a crescente dificuldade econômico-financeira da população, diante da concentração de renda cada vez mais intensa provocada pela chamada “globalização”, que é a internacionalização de todo o processo econômico, prenúncio do surgimento de uma nova ordem mundial, em que o poder político estará acima dos países, que outro não será senão o governo do Anticristo.

- Como as pessoas passam a ter crescentes dificuldades econômicas, mas, ainda assim, não deixam de dar prioridade às coisas terrenas, às coisas desta vida, pois é esta a característica daqueles que não têm compromisso com Deus (cf. Mt.6:32a), torna-se uma mensagem agradável aos ouvidos do povo aquela que apregoa que o Evangelho traz prosperidade material e imunidade contra a pobreza e a doença. Muitos, então, vão atrás de Jesus não porque queiram ter vida eterna, mas apenas para obter estas vantagens, que, a cada dia que passa, o sistema econômico lhes vai negando. Querem não servir a Jesus, mas, sim, se servir de Jesus e é precisamente esta a mensagem do triunfalismo, a mensagem antropocêntrica da “teologia da prosperidade”.

- Estas pessoas, como diz o apóstolo Paulo, são as mais miseráveis criaturas humanas da face da Terra(I Co.15:19), porque, sabendo quem é Jesus e o que veio fazer neste mundo, querem apenas dEle se servir para terem bens e tesouros que nada lhes representará na eternidade. São pessoas que, infelizmente, não seguem a doutrina de Cristo que, tão explicitamente exposta no sermão do monte, nos manda ajuntar tesouros no céu e não na terra, pois onde estiver o nosso tesouro, ali estará o nosso coração (Mt.6:19-21).

- O triunfalismo é uma tentativa de justificação deste apego às coisas materiais por intermédio de uma roupagem evangélica, de uma aparência bíblica, mas um exame acurado das Escrituras desmente cabalmente o que é dito por estes homens enganadores. As multidões, impregnadas do amor ao dinheiro, raiz de toda a espécie de males (I Tm.6:10), são tão avarentas e desgraçadas quanto os “mercenários da fé”. Tanto um quanto o outro são idólatras, servem às riquezas e quem serve às riquezas, não serve a Deus (Mt.6:24).

- Neste passo, são, também, práticas triunfalistas condenáveis os “sacrifícios”, os “carnês” e toda e qualquer espécie de contribuição financeira que é dada com o intuito de estabelecer uma barganha com Deus. Muitos têm tratado os dízimos, as ofertas e demais contribuições como “investimentos”, como um “toma-lá-dá-cá”, como se Deus Se prendesse a gestos feitos pelos homens. Deus tem compromisso com a Sua Palavra e é evidente que há uma regra bíblica para as finanças da igreja local, mas nada disso é previsto nas Escrituras como um laço que obrigue Deus a enriquecer quem quer que seja. Tais práticas em nada diferem das “indulgências” do Romanismo, que são concebidas como perdão de pecados que a Igreja Romana pode dar em troca de obras meritórias feitas pelos fiéis, entre as quais a contribuição financeira para a organização religiosa. É triste ver que, quinhentos anos depois de Lutero, serem alguns “evangélicos” os maiores distribuidores de “indulgências” na atualidade. É a apostasia que caracteriza, sempre, os dias finais de uma dispensação na história da humanidade…

- A Bíblia diz que Deus ama a quem dá com alegria (II Co.9:7 “in fine”), não a quem dá com ganância. Se participarmos destas atitudes, destas práticas, estaremos não só ajudando a enriquecer pessoas inescrupulosas, como também selando a nossa própria condenação, pois, com este gesto, denunciaremos que, tanto quanto estes exploradores da fé, também amamos o dinheiro e, por causa deste amor, nos desviamos da fé, tornando-se idólatras, já que avarentos e gananciosos (Cl.3:5). Se tivermos uma verdadeira vida santa, contentar-nos-emos com o que temos (Hb.13:5) e, portanto, não seremos seduzidos pelas promessas de “enriquecimento súbito” trazidas pelos triunfalistas, que são descritos pelo apóstolo Pedro como “tendo o coração exercitado na avareza, filhos da maldição” (II Pe.2:14 “in fine”).

- Também aqui se insere outra prática triunfalista, qual seja, a “restituição”, idéia que ficou popularizada no cântico cujo refrão é ” Restitui…eu quero de volta o que é meu”. Esta prática é, também, uma fonte de dinheiro para muitos inescrupulosos que, através de “campanhas de restituição”, têm levado multidões a “exigir de Deus o que foi tomado, o que é meu” e, além de lhes causar a abominação do Senhor, ainda por cima acabam tomando o que havia ficado, por meio de ofertas e “sacrifícios”, habilmente solicitados nestas mesmas campanhas.

- Como bem afirmou o pastor e professor José Mathias Acácio, “…Vivemos pela graça. Graça foi, é e sempre será favor imerecido. TUDO o que recebemos das mãos de Deus é graça. Não temos direito a nada(…). O que é a graça, senão recebermos de Deus tudo aquilo que não merecemos, que não nos pertence e que nos é dado gratuitamente por Aquele que é Senhor de tudo e de todos? Quando eu acho que sou dono das minhas coisas e que tenho ‘direito’ sobre elas, automaticamente excluo o verdadeiro dono. Ninguém pode servir a dois senhores. Ou Deus é o dono de minha vida e, por conseqüência, dono de tudo o que me é dado, ou EU sou o dono de tudo e aí, sim, sirvo a mim mesmo, tendo direitos exclusivos sobre aquilo que é ‘meu’…” (Modismos evangélicos. Resumo escrito da aula inaugural do 2. trimestre de 2006 da Escola Bíblica Dominical, proferida na Assembléia de Deus do Belenzinho, São Paulo/SP em 1 abr. 2006, p.3-4)

- Não podemos compactuar com estas práticas de “restituição” e de tudo o que envolva esta idéia, pois ela é pura e simplesmente manifestação de rebelião contra Deus, porquanto ao acharmos que algo é “nosso”, que deve ser devolvido, estamos afirmando uma ilusória independência do homem em relação a Deus, exatamente o que fez o primeiro casal pecar e perder a comunhão com o Senhor. Ao invés de “querer de voltar o que é nosso”, devemos ter o mesmo sentimento que houve em Cristo Jesus, que foi expresso pelo apóstolo Paulo numa das suas frases lapidares: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou e se entregou a si mesmo por mim.” (Gl.2:20).

IV – ORAÇÃO E LEITURA DA BÍBLIA – AS ARMAS EFICAZES CONTRA O TRIUNFALISMO

- No tópico anterior, vimos que o triunfalismo tem alcançado grande êxito por causa do ambiente sócio-econômico-ideológico-espiritual dominante nos nossos dias, mas, como deve ter se percebido, apenas enfocamos os fatores sociais e econômicos. Falta-nos, portanto, analisar o aspecto ideológico e o aspecto espiritual.

- Ao falarmos em aspecto “ideológico”, estamos a tratar de “ideologia”, que é, no significado que estamos a utilizar, o “sistema de idéias (crenças, tradições, princípios e mitos) interdependentes, sustentadas por um grupo social de qualquer natureza ou dimensão, as quais refletem, racionalizam e defendem os próprios interesses e compromissos institucionais, sejam estes morais, religiosos, políticos ou econômicos.” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).

- Quando estudamos os dias atuais, no quarto trimestre de 2005, observamos que o nosso tempo é caracterizado por uma ideologia que não leva em conta a figura de Deus e que é centrada no homem, ele próprio considerado um “deus”. A religiosidade que ressurgiu com toda a sua força a partir da Segunda Guerra Mundial tem se caracterizado por uma busca do sobrenatural a partir da própria figura humana, o que explica o sucesso que as religiões orientais têm tido no Ocidente.

- Há, assim, uma “divinização” do ser humano, uma exaltação exagerada do homem, um “humanismo” que, com busca de uma sobrenaturalidade, procura se diferenciar do elogio que se fez ao homem logo depois da Idade Média, quando se entendia que a razão e, por extensão, a ciência resolveria todos os problemas da humanidade. Como o homem, ao invés de resolver seus problemas, criou outros mais, passou a culpar este fracasso pelo seu “materialismo”, passando, então, não a voltar-se para Deus, o que seria o certo, mas tão somente a buscar “dentro de si”, o “sobrenatural”, o “místico”, a “espiritualidade”, que seria o que lhe estaria a faltar para atingir uma “nova era”.

- Pois bem, é dentro deste contexto que se insere o triunfalismo. Ainda que com roupagem bíblica e evangélica, o triunfalismo deixa Deus de lado e passa a valorizar o crente. Já perceberam que o culto a Deus passou a ser uma exaltação do crente em vez de ser voltado para o Senhor? Já perceberam que os “louvores” que têm alcançado número recorde de vendas pouco falam de Deus e muito do crente, pouco falam da majestade divina e mais dos sentimentos “puros” e “profundos” que o crente tem ao se apresentar diante do Senhor?

- Uma prática triunfalista é, portanto, tornar o homem o centro do culto, o centro da adoração. Não Se adora a Deus, mas se busca, na “adoração”, sentir-se bem, aliviado, livre da tensão do dia-a-dia, o que, aliás, explica porque, normalmente, os triunfalistas recorrem às mesmas técnicas e estratégias de relaxamento mental que são usadas pelas “terapias alternativas” esotéricas e holísticas da Nova Era …

OBS: Já há pessoas que ensinam que não se deve orar sem que se tenha uma música suave ao fundo…

- Como resultado direto desta ideologia humanista, antropocêntrica, o triunfalismo menospreza, quando não critica abertamente, os dois pilares da vida devocional do cristão: a oração e a leitura da Bíblia Sagrada. Fazem, assim, o que as lideranças romanistas fizeram durante séculos na Idade Média.

- Quando o crente não está voltado para si, mas, sim, para o Senhor, ou seja, quando Deus é o centro da vida da pessoa, ela não consegue viver sem que esteja em constante comunicação com o seu Senhor e isto se dá seja pela oração, seja pela meditação constante das Escrituras. Crente que se volta para Deus precisa ouvi-lO falar e falar com Ele constantemente, ininterruptamente e é por isso que a Bíblia diz que devemos orar sem cessar(Ef.6:18 “in initio”, I Ts.5:17) e meditar na Sua Palavra de dia e de noite (Js.1:8; Sl.1:2).

- O crente que ora incessantemente, que tem uma vida de oração, não precisa participar de “campanhas”, nem é levado por elas, porque conhece a voz de seu Senhor e por Ele é conhecido (Jo.10:14), não se baseando, assim, em climas emocionais superficialmente criados, porque desfruta de uma intimidade com Deus (Mt.6:6). É um crente que não substitui a sua oração sincera e que vem do profundo de seu espírito, uma verdadeira oração no espírito (Ef.6:18), por “fórmulas de fé”, “correntes de oração”, “determinações”, “novenas”, “meditações”, “concentrações”, que nada mais são que nomes novos para as “vãs repetições” condenadas por Jesus e que já eram praticadas pelos gentios há séculos (Mt.6:7,8).

- Infelizmente, quando o crente não ora, nos momentos de dificuldade e de necessidade, tem a tendência de recorrer a estas “fórmulas mágicas”, a estes verdadeiros “mantras” e “rezas” dos triunfalistas, achando que, desta maneira, conseguirá o favor divino. É muito cômodo para o crente relapso, que não tem intimidade com Deus, usar destes subterfúgios para ter um “atalho” ao trono da graça, mas, como todos sabemos, se não for pelo caminho traçado por Deus, jamais conseguirá algo.

- Precisamos, nos dias em que vivemos, levar o povo de nossas igrejas locais à prática da oração. Falta oração nas igrejas, nós, mesmos, temos nos dedicado pouco à oração. Por isso, não temos visto tanto a presença de Deus em nossas reuniões e em nossas vidas, porque não pedimos e é necessário que peçamos para que o Senhor nos atenda (Mt.7:7; Lc.11:9; Jo.16:24).

- A oração não é uma fórmula mágica, um “abracadabra” que se dirige a Deus, como ensinam os triunfalistas, nem tampouco uma exigência de supostos “direitos” que tenhamos diante de Deus, mas uma expressão da nossa comunhão com Deus, uma troca de vivências e de experiências entre Deus e o homem, um contínuo aprender de Deus, uma continuada submissão da nossa vontade, a ser clara e explicitamente revelada e confessada ao Senhor, à vontade de Deus, que também no-la revelará em toda a Sua plenitude. O crente que ora é aquele que pode dizer como Jesus, “…tudo quanto ouvi de Meu Pai vos tenho feito conhecer” (Jo.15:15 “in fine”).

- Se levarmos o povo a orar, se nós mesmos orarmos incessantemente, ouviremos coisas grandiosas de Deus, aprenderemos muito dEle, saberemos como e o que pedir e não necessitaremos correr daqui para ali, nem dar dinheiro aqui e ali, para sentirmos a presença de Deus e para obtermos as bênçãos de Deus. As maravilhas, os sinais e as coisas extraordinárias que os triunfalistas nos lembram em suas pregações podem, sim, realizar-se nos nossos dias, mas dependem da mesma vida de oração que era mantida pelos homens de Deus que forma os instrumentos do Senhor. É necessário pagar o preço para sermos vasos para honra e santificação, pois nós somos filhos de Deus e não magos ou feiticeiros.

- Mas, além da vida de oração, temos de ter uma meditação constante das Escrituras, devemos manejar bem a palavra da verdade (II Tm.2:15). O desconhecimento da Palavra de Deus é a causa da destruição do povo (Os.4:6) e não é coincidência que os triunfalistas sejam, simultaneamente, os principais inimigos do estudo da Bíblia Sagrada na atualidade.

- Quando conhecemos as Escrituras, logo percebemos as sutilezas do adversário e, logicamente, os falsos mestres, que são agentes do inimigo, não querem que os desmascaremos. Quem estuda as Escrituras, quem se dedica a uma leitura metódica e devocional do texto sagrado não se deixa seduzir facilmente pelo triunfalismo.

- Os triunfalistas sempre dão a suas pregações egocêntricas e megalomaníacas uma roupagem bíblica. Assim, não faltam imagens e narrativas bíblicas para ilustrarem as suas “campanhas” e os seus “movimentos”. Um dia, é a “campanha da derrubada das muralhas de Jericó”; outro dia, o “jejum de Moisés”; depois, vem “os trezentos de Gedeão”, para não nos esquecermos dos “trinta valentes de Davi” e por aí afora. São, porém, verdadeiras “peles de ovelhas” que se colocam atrás destes movimentos que são “lobos cruéis”, prontos a devorar não só o bolso dos incautos (que é o que pretendem estes mercenários), mas, e isto é mais grave e o mais relevante, a própria fé e a alma dos que se decepcionarão com o não cumprimento destas promessas (que é o que pretende aquele que está por detrás destes movimentos).

- Como bem salienta o nosso comentarista, uma noção ainda que superficial das regras da chamada “hermenêutica”, ou seja, da ciência da interpretação da Bíblia, é suficiente para desbaratar e desmontar todas estas armadilhas criadas pelos triunfalistas e que têm enganado a muitos. O problema é que a grande maioria dos crentes não lê a Bíblia e os poucos que a lêem não têm a mesma prudência demonstrada no diálogo entre Filipe e o eunuco (At.8:26-40). Ali, verifica-se que, de um lado, o evangelista Filipe tinha a preocupação não só de anunciar a Palavra de Deus, mas de fazê-la entendida por quem a ouvisse, enquanto que, de outro lado, o eunuco também era um leitor atento, alguém que, além de querer ler, queria entender o que estava lendo e estava disposto a ouvir a explicação a respeito do que está escrito.

- Meditar na Palavra de Deus, envolve, portanto, dois pontos: a leitura e o entendimento. Ora, a leitura só caminha até o entendimento se houver a explicação. Foi, por isso, que os apóstolos se dedicaram, com prioridade, ao ministério da palavra (At.6:2,4) e que Jesus constituiu mestres para o aperfeiçoamento dos santos (Ef.4:11,12). Somente se cada crente for ensinado convenientemente na Palavra, de modo a ter uma vida devocional diária de meditação nas Escrituras, como também motivado a participar das reuniões de ensino da igreja local, que devem ser prestigiadas e valorizadas pelo ministério, é que poderemos escapar da armadilha do triunfalismo, como, de resto, de toda e qualquer falsa doutrina.

- Não é nosso propósito aqui fazermos um curso de hermenêutica, mas, a grosso modo, podemos alinhavar algumas regras que devem orientar a leitura da Bíblia Sagrada e cuja aplicação, de pronto, elimina toda a “força” da aparência bíblica da mensagem triunfalista. Para tanto, valemo-nos aqui do artigo “Hermenêutica”, de Natanael Nogueira de Sousa e Kleber Paulo de Santana, que se encontra em http://sites.uol.com.br/revistadominical/Estudo/hermeneutica.htm”>http://sites.uol.com.br/revistadominical/Estudo/hermeneutica.htm (acesso em 27 abr. 2006).

- A primeira regra é a melhor intérprete para a Bíblia é a própria Bíblia, ou seja, a Bíblia explica a si mesma. Sempre que encontrarmos um determinado pensamento ou conceito num determinado texto bíblico, devemos confrontá-lo com a própria Bíblia, a fim de que não sejamos induzidos a erro. É por isso que um texto isolado, solitário JAMAIS poderá dar base uma doutrina bíblica.

- A segunda regra é o que diz que “É preciso, o quanto seja possível, tomar as palavras em seu sentido usual e comum”, ou seja, devemos sempre entender o texto com o significado imediato que ele se nos dá. É muito perigoso querermos sempre ver o texto como um “símbolo”, uma “figura”, uma “alegoria”. Verdade é que boa parte da Bíblia Sagrada é composta de textos que contêm figuras, símbolos, tipos e alegorias, mas, num primeiro instante, devemos sempre considerar o texto assim como ele está escrito, sem elucubrações. Precisamos ler a Bíblia para saber O QUE ela contém, não para enxergamos o que PENSAMOS que ela tem.

Exemplo: Em Mt.12:46, é dito que pretendiam falar com Jesus Sua mãe e Seus irmãos. Ora, a palavra “irmãos” deve ser entendida em seu sentido usual, ou seja, pessoas que têm os mesmos pai e/ou mãe, não havendo motivo algum para ser entendido que esta palavra tenha outro significado.

OBS: O grande filósofo e teólogo Erasmo (autor do “Textus Receptus”, que é a versão das Escrituras que serviu de base para a maioria das versões protestantes da Bíblia, inclusive para a Versão de João Ferreira de Almeida) (1467-1536) costumava afirmar que deveríamos agir como Isaque, que removeu as pedras que haviam sido postas para tapar os poços abertos por seu pai Abraão por parte dos filisteus. De igual modo, os crentes devem procurar a água, que é a Palavra de Deus, retirando das suas mentes todos os conceitos e idéias que tenham antes de ler o texto sagrado (os “pré-conceitos”), pois podem ser idéias e conceitos que foram colocados pelo inimigo, assim como os filisteus eram inimigos do povo de Deus.

- A terceira regra, que é decorrência da segunda, diz que “É de todo necessário tomar as palavras no sentido que indica o conjunto da frase.”Além de verificarmos o significado da palavra, tomada ela isoladamente, é fundamental que verifiquemos este significado no conjunto, pois cada palavra tem diversos significados (que o digam os dicionários), mas somente um ou alguns são apropriados num determinado conjunto de palavras.

Exemplo: Ainda em Mt.12:46, quando verificamos a palavra “irmãos”, vemos que ela se encontra num contexto de indicação de parentesco, já que, na mesma oração, temos a palavra “mãe”. Por isso, embora “irmão” tenha, também, o significado de “discípulo”, de “quem compartilha da mesma fé” (como se vê em I Co.15:58), não é este o significado aqui, porque o conjunto das palavras nos leva à constatação de que se trata de parentesco.

- A quarta regra diz-nos que “É necessário tomar as palavras no sentido indicado no contexto, a saber, os versículos que estão antes e os que estão depois do texto que se está estudando,” ou, em outras palavras, estudar o “texto no contexto”. Quando vemos alguém ler um livro qualquer, nunca aceitamos que ele leia o pedaço de uma página e, depois, nos diga que já entendeu toda a história do livro. Por que, então, aceitamos que isto se faça com a Bíblia Sagrada, que é a Palavra de Deus? Esta é a principal distorção causada pelos triunfalistas. Eles retiram o texto do contexto e criam um “pretexto”, ou seja, “motivo que se declara para encobrir a verdadeira razão de algo”, que é, precisamente, o que procuram para fazer a sua “arrecadação de fundos”.

Exemplo: Costuma-se dizer que “diante de Deus até a tristeza salta de prazer” (aliás, ensino muito repetido pelos triunfalistas) e, para tanto, se usa como base Jó 41:22b. Entretanto, quando vamos ao texto, verificamos que este versículo se encontra inserido num capítulo em que Deus faz uma série de interrogações a Jó e, mais, que, neste capítulo, Deus está a fazer uma comparação entre o leviatã e o homem. Portanto, este “ele” do versículo 22 é o leviatã e não, Deus.

- A quinta regra diz-nos que “É preciso levar em consideração o objetivo ou desígnio do livro ou passagem em que ocorrem as palavras ou expressões obscuras.” Não basta termos conhecimento do significado das palavras, seja isoladamente, seja em conjunto. É preciso, também, sabermos qual é o propósito do texto, ou seja, se o escritor quis narrar uma história, se está a expressar a sua sensibilidade (poesia) ou, ainda, se está a descrever uma visão, um sonho ou, ainda, se está a explicar ou a ensinar algo. Sem termos noção deste propósito do livro ou do texto, nunca encontraremos o seu real significado.

Exemplo: No Sl.23, sabemos que o salmista não diz que os crentes são animais que vão ser postos num pasto literal, mas, diante do propósito poético do texto, sabemos que a consideração do crente como uma ovelha é uma alegoria, é uma figura para nos explicar o relacionamento que Deus tem para com o homem.

- A sexta regra ensina-nos que “É necessário consultar as passagens paralelas, “explicando cousas espirituais pelas espirituais” (I Cor. 2.13). Como já vimos, a Bíblia explica-se a si própria, de forma que sempre há passagens que se relacionam, que tratam de mesmos temas, assuntos, que contêm os mesmos ensinos. Daí a importância das referências bíblicas que sempre aparecem à margem ou no rodapé das bíblias.

Exemplo: Em Gl.6:15, é dito que o que importa é ser “uma nova criatura”. Mas o que é “nova criatura”? O texto de II Co.5:17 explica-nos que “nova criatura” é “alguém que está em Cristo”. Mas, o que é “estar em Cristo”? O texto de Jo.15:1-8, por sua vez, mostra-nos que “estar em Cristo” é “ser discípulo de Cristo”. Por fim, para ser discípulo de Cristo, vemos, em Jo.3 e em Mt.16:24, é necessário nascer de novo, renunciar a si mesmo e seguir a Jesus.

- Com estas regras básicas, muito do que é apregoado pelos triunfalistas é desfeito e destruído, pois simplesmente não se sustenta. Por que haveremos de passar por uma “corrente de trezentos servos de Deus” para obter uma bênção? A simples leitura do texto em que se fala dos trezentos homens de Gedeão é suficiente para nos mostrar quais os ensinos bíblicos que se fazem a respeito e que nada têm que ver com “correntes” ou coisa parecida. Também uma simples leitura do texto bíblico nos desencoraja a participar de qualquer campanha para retirar a “amargura da vida” mediante a “entrega de ervas amargas”. Quem lê e entende a Bíblia, porque busca sua explicação na própria Bíblia, no Espírito Santo e nos mestres constituídos pelo Senhor na igreja local, terá a mesma vitória sobre estes enganos como teve Nosso Senhor quando enfrentou o inimigo no deserto da Judéia. Caro(a) professor(a) e aluno(a) da Escola Bíblica Dominical, tens entendido o que lês? (se é que lês?).

Autor: Prof. Dr. Caramuru Afonso Francisco.

Nenhum comentário: